História mal contada (conto)

24, jul, 2021 | Artigos | 3 Comentários

 
Por Rafael Teixeira de Souza
 
 

Para meu avô Zuza, in memoriam

Joaquim Quatro-Ventas, um dos tipos mais emproados daquelas redondezas, fazia questão de andar com a peixeira a avolumar-se por baixo da surrada camisa de flanela, cujos remendos originaram-se, em sua maioria, dos mergulhos que dava na caatinga cerrada em busca de vacas que, vez ou outra, desgarravam-se do restante de seu rebanho. Reinoso, o cavalo baixeiro, também carregava em todo o corpo marcas daquelas aventuras sem horário, através de fundas cicatrizes e arranhões superficiais que os rasga-beiços lhe desenharam.

Aos 55 anos, Quatro-Ventas já furara muito bucho de cabra metido a pirracento, que o desafiava a trocar sopapos no salão de dona Filomena Tavares ou na bodega de seu Josias Albuquerque. O turuna ostentava renome em tudo que era canto, chegando a colecionar desavenças em mais de uma dezena de povoados, bem como marcas na pele tão fundas quanto as provocadas pelos arbustos espinhentos.

Era intrigado de-sangue-a-fogo de seu Miguel do Caritó, cuja filha Raimunda se entregara a ele numa noite de forró, lua cheia e estrelas cintilantes, embaixo de um jamelão na propriedade paterna. Foi a ocasião em que mais esteve perto da morte, pois quando o próprio pai flagrou a filha praticando algo que o levou a chamá-la de guenza, por pouco não recebera dele um tiro de lazarina. O mesmo tiro, aliás, fôra destinado a Quatro-Ventas, mas o chumbo passou-lhe muito perto, a um palmo de distância, vindo a acertar um pé seco de embira. E ele, correndo com as mãos nas calças e a ceroula pouco abaixo do quadril, só se lembra de ter rolado duma ribanceira e acordar já no dia seguinte, ainda soluçando Montilla e arrotando sarapatel.

Descobrira-se na casa da mãe, e perguntou-lhe quem o levara ali. Amigos dele, ela dissera, referindo-se em seguida à história, que já circulava nos arrabaldes, do que sucedera na noite passada. Quatro-Ventas viu-se, então, obrigado a fugir. Era isto ou entregar-se ao destino inaceitável: casamento com a filha de seu Miguel. A mãe reprovou-lhe a fuga, argumentando que o certo tinha de ser feito, mas ele atalhou:

— Nem morto!

Na mesma hora juntou seus picuás numa trouxa, encilhou a égua e partiu, sem dizer aonde ia, embora prometesse que regressaria. No entanto, não o fez. Em vez disso, passou a morar na fazenda Boa Esperança, a vinte e poucas léguas daquelas terras, e que lhe fora conseguida mediante a venda de sessenta e oito reses e uns tantos cabritos. Daqueles doze hectares pouco se aproveitava, não havia rio e o barreiro mais próximo ficava a duas léguas de estrada pedregosa, forrada de barrocas e costelas de vaca, e o único meio de buscar água era num carro de bois.

Em todo caso, nas noites de domingo, a cada quinze dias, Quatro-Ventas ia farrear, e jamais partia das biroscas sem meter-se em carraspanas ou rabos de saia, atrevimento costumeiro que, segundo contemporâneos seus, fê-lo emprenhar várias mulheres. As mães de seus filhos, ressalte-se, incluíam o nome dele numa lista em que constava uma dezena de outros possíveis pais das suas crianças, criadas à base de farinha de mandioca, xerém, rapadura e carne de sol.

A atual mulher dele chamava-se Lucineide. Conhecera-a no Poço das Ovelhas, povoação de vinte taperas onde as moças restantes eram ela e outras três. O mais eram casais de velhos na faixa dos setenta anos para cima, já entregues à mercê da seca que à época imperava. O pai de Lucineide, seu Vitalino, era negociante de gado; e foi na aquisição de duas novilhas que, como brinde, o futuro genro granjeou-lhe o coração da filha.

— Proceda bem com ela — pediu o velho. — É boa moça e muito cuidadeira.

— Pode deixar, seu Vitalino — asseverou ele. — E mais: prometo visitar o senhor três vezes no ano.

Desde então, nunca mais voltou. Lucineide, por seu lado, jamais se queixava desta ou de qualquer outra falha do marido, porque vivia sem aperreios. Passava o dia costurando na sombra, não lhe faltava comida à despensa, e por mais que Quatro-Ventas tivesse defeitos e lhe pusesse chifres, não obstante era bom marido.

Dessa união, ocorrida onze anos antes do lance aqui narrado, nasceram quatro filhos, todos homens dos seis aos dez anos. Os meninos, que tinham pouco interesse em estudar ou executar pequenos trabalhos no campo, preferiam passar seus dias embaixo das cajazeiras, tentando pegar papa-capins com alçapões ou matar rolinhas com pedradas de estilingue. Seu pai, que não ligava importância a eles, preferia vê-los vadiando a seguir seu caminho, porque o próprio julgava valerem mais quatro almas parvas do que quantas existissem escabreadas.

A única obrigação que os moleques tinham, com efeito, era acompanhar o pai nas idas ao barreiro, quando estes enchiam junto dele os tambores com água. Tal compromisso, no entanto, alegrava-os sobremaneira, pois eles se divertiam ao açoitar os lombos dos bois de carro, os quais se contorciam de dor em contraste com o riso desbragado dos pivetes.

— Podem parar, seus empestados! — esbravejava Quatro-Ventas.

Os meninos encolhiam-se, calando. Quando chegavam, o pai pedia-lhes que descessem, e ele fastava o carro de bois, deixando-o com a traseira virada para a orla do barreiro. Daí os meninos, servindo-se de coités, o ajudavam a encher as latas de zinco com água salobra e despejá-las nos tambores. Após a tarefa, que lhe tomava pouco mais de uma hora, Quatro-Ventas amarrava bem a carga e tocava para casa. A essa hora, quase meio-dia, o almoço já esfriava. E antes de uma da tarde, todos enxiam a barriga, passando a sesta no alpendre, deitados no cimento ou em redes.

Na hora seguinte, Quatro-Ventas montava em Reinoso e seguia até o cercado, arrebanhando as vacas. Nessa época, ele tinha 46 cabeças, um touro e dois bois entre elas, a maioria das quais produziam individualmente pouco mais de vinte litros de leite diários, vendidos a seu Lourenço dos Monturos. Entretanto, certa tarde, ao chamar suas vacas e ver que quase todas já se topavam fronteiramente à cancela, notou a falta de uma. Tratava-se de Mimosa, girolanda de sua predileção, uma das mais leiteiras. Quatro-Ventas coçou a cabeça, coberta pelo chapéu de couro, e depois o queixo. Pensou em abrir a porteira e tanger os animais ao curral, mas como Mimosa nunca era de faltar, preferiu procurá-la e embrenhou-se na caatinga, deixando as demais berrando.

Já começavam a cair os primeiros invernos de maio, e por essa razão os galhos pelados dos pereiros vestiam-se de folhas viçosas, dificultando a visão de quem buscasse algo. Quatro-Ventas então optou por trotar, parando e lançando os olhos nas redondezas.

— Mimosa! Mimosa! — chamava ele, as mãos juntas na boca para dar eco à voz.

Sua testa vincada denunciava uma situação pela já qual passara inúmeras vezes, nenhuma, porém, com absoluta ausência de pistas. Nesse caso, seguiu a trote lento. As aroeiras e jucás, com suas sombras imponentes, revelavam as veredas das vacas, que naqueles espaços pezunhavam e descansavam após pastar. Os cascos de Reinoso espalhavam a água das poças, e aqui e acolá se distinguia o assovio do azulão, do galo de campina e do salta-caminho. Tais sensações, embora acarinhassem as orelhas de Quatro-Ventas, impeliam-no a cogitar no que afinal sucedera a Mimosa.

Acontece que, como quem se ergue da terra, de uma moita de muçambê surdiu uma onça. Ela se revelou de supetão; e Reinoso, quando a avistou, soltou um relincho estridente, arregalando os olhos. Tão bruscamente ele erguera as patas dianteiras e sacudira os cascos que, quando veio se dar conta, Quatro-Ventas já tinha caído com o traseiro no chão, muito próximo a um toco de mandacaru que por pouco não o feriu. Assim que ergueu as costas do solo molhado, enxergou o cavalo embrenhando-se mata adentro, na direção contrária à do felino, como se antevisse o risco que corria.

— Danou-se! — bradou Quatro-Ventas.

E fitando a onça, engoliu em seco. Ela devia estar a trinta metros, distância de sobra para ele dar com os latejos de seu coração e o ar lhe faltando. O sangue-frio foi o que lhe valeu a seguir, pois antes de a onça atacá-lo ele se ergueu devagar e se manteve parado. Conquanto tremesse, trincava as mandíbulas e cerrava os punhos, a fim de se concentrar ao máximo. “Se ela me atacar”, concluiu, “meto-lhe a peixeira.” Mas o temor que o conteve à medida que o animal se aproximava fê-lo ter uma reação no mínimo inesperada para um homem de sua procedência. Ele deu uma carreira e, como um gato acuado por cães, trepou-se numa baraúna.

Tudo se deu muito rápido. Ele constatou que ia ser atacado, que não daria tempo de puxar a faca e sangrar a onça, e achou melhor encarapitar-se, reação doida que só um momento de sufoco daquele podia ensejar. Quando ele passava da altura do tronco foi que a onça, fixando para cima, o assistiu a agarrar-se num dos galhos da árvore. Um bramido rasgado saía da garganta do bicho. E ela, saltando em sua direção, subitamente passou a azunhar a casca da baraúna, como quem ameaçasse subir e comer a presa.

— Pronto! — atestou Quatro-Ventas, quando seu chapéu caiu da cabeça. — Desta vez me lasco.

“Sim, meu amigo, chegou a sua hora”, informava-lhe a consciência. “É hora de pagar pelas peixeiradas e pelos buchos.” “Se for o caso”, sua voz interna replicou, “eu me arrependo.” “Não há mais tempo”, exprimiu-se de novo sua consciência. “Seja como for, é hora ideal para se despedir.” E mantendo-se seguro num dos galhos mais altos, direcionando as vistas para baixo, acompanhava a onça mostrar-lhe os dentes, emitindo um gemido gutural que parecia ter espantado o canto dos pássaros. Ao mesmo tempo ele verificava que o galho em que se agarrara começava a vergar pelo seu peso. Cogitou gritar, mas dificilmente alguém o socorreria, uma vez que sua valentia cismara qualquer um que já se atreveu a pisar naquelas terras. E seus filhos, que conseguiriam efetivamente escutá-lo, de qualquer modo não poderiam socorrê-lo, pois as armas de que dispunham eram seus estilingues, cujas pedradas às vezes nem espantavam os anumarás da roça de algodão.

— Valha-me meu Padim Ciço do Juazeiro! — chorou ele, discernindo um estalo do galho em que se pendurara.

A tremura que o tomava, de tão indominável, parecia também afetar a árvore. E como ele não podia largar uma das mãos para se benzer, posto que se o fizesse arriscava-se a cair, persignou-se imaginativamente, como recebendo a extrema-unção. Projetou as dores de quando o felino lhe cravasse as presas no cangote, o estripasse, seu sangue jorrando e o animal a lambê-lo… Ouviu outro estalo, e verificou que a onça não se movera uma polegada. Em verdade, parecia fixá-lo com olhos continuamente maiores, e com saliva a escapar-lhe por baixo das ventas.

— Chegou a hora de me confessar — bodejou. — Se não for com o vigário, será com Deus, a Virgem Maria e Padim Ciço.

Ideando a primeira divindade, pediu-lhe a remissão dos pecados. Fez alusão, inclusive, aos homens perfurados pelas lâminas de suas facas, tanto os ainda vivos, de panças cosidas, quanto os que já partiram para outro plano. Evocou as tantas lágrimas que desconhecidos derramaram por sua causa, malquerenças e demais sentimentos ruins que por tais práticas ele despertara em corações puros — corações de mães, esposas, filhos… E projetou-se como o Bom Ladrão, aquele que esteve com Cristo no Calvário, mas sem o merecimento suficiente para ir com Ele ao Paraíso.

Dirigiu-se, em seguida, a Nossa Senhora. Rogou-lhe perdão pelas tantas mulheres embuchadas na juventude, sobretudo porque não dera sustento a seus filhos. Quantos deles encontravam-se espalhados por aquelas bandas, sararás chochos que padeceriam de fome, sarampo, lombrigas?… Compungia-se, pois se fosse homem no que se entende da palavra, se encorajaria e buscaria um por um, trazendo-os para morar consigo, ou, ao menos, ofereceria auxílio financeiro a suas mães. No transcurso dessa reflexão, esboçou-se-lhe arrependimento dos pega-pegas; mas, contando-os de cabeça, tomou nota de que nenhum deles sucedera sem consentimento. Nesse caso, a culpa minorara-se, mas não se extinguiu. Fora irresponsável, e muito. Ponto final.

Pintava-lhe, também, arrependimento pelas puladas de cerca. Era um patife, isto sim. Uma mulher tão transigente e escrupulosa como a sua, que costurava-lhe os remendos do gibão e preparava galinha capoeira aos domingos, não merecia semelhante safadeza, fosse da parte dele ou de qualquer outro… Lembrou-se, por conseguinte, da mãe. Será que continuava viva? E, se estivesse, perdoaria ou não sua ausência de quase uma década? Era outra não merecedora de que tal sujeito lhe tivesse saído das entranhas. Sentiu estremeço maior, de remorso, à parte dos demais.

Os seus filhos conhecidos foram os que, em seguida, lhe apareceram à mente. Como seria bom se pudesse lhes dar um futuro melhor! Que nem seu Lourenço dos Monturos, cujas filhas gêmeas foram estudar na capital. No seu caso, quando os meninos declararam que iam abandonar a escola, ele nem objetou — contrariamente à Lucineide, que ralhara com eles e se opôs. Mas como a palavra do pai era a última, ele sentenciou que tomassem o destino de suas preferências, pois já eram crescidos o suficiente.

Seus pensamentos, então, voltaram-se a Padim Ciço. Esse ser, metade homem e santo, foi o mesmo cuja mão direita seu pai apertara e beijara, inclinando-se, quando o encontrou em Salgueiro no ano de 1926. Ora, se conhecia seu pai, V. Revmª bem poderia conhecê-lo também, no Céu de onde tudo espiava. Quatro-Ventas vislumbrava-o agora, o padre com sua cabeleira encanecida, olhos franzidos e a parte branca da gola a destacar-se no preto da batina, envolto num halo imaculado que encandeava as vistas mais tenazes. “Me perdoe”, murmurou, percebendo seus olhos rentes d’água.

Veio-lhe, pois, a imagem de Raimunda, filha de Miguel do Caritó, e suspirou a seguinte promessa ao santo que o fitava com misericórdia:

— Se me der livramento, prometo pedir perdão ao velho e à filha dele.

Julgou que tal atitude poderia lhe custar a vida, afinal, como já indicado, foi com seu Miguel que Quatro-Ventas mais se aproximara da morte. Mas, como ele sempre inferia, um homem valente vale por quantos sejam, e todos os covardes valem por nenhum. Imaginou-se de regresso àquelas paragens, recebido pelos enormes vira-latas do velhote e dirigindo-se a ele de mãos limpas. Sua sinceridade ululante, é possível, se converteria em subterfúgio para livrá-lo da sentença capital. “Vim aqui pagar minha dívida”, argumentaria ao pai ofendido. Ao que lhe exigisse estaria disposto a ceder, incluindo algumas braças de terra de sua propriedade, contos de réis ou cabeças de gado. Até Reinoso, se fosse encontrado, entraria no negócio.

— Me corrijo — advertiu Quatro-Ventas com voz decidida. — Se me der livramento, dou Reinoso ao senhor, assim que eu achar ele… Eu juro!

Era como se testemunhasse o perfil do santo aquiescer sua proposta com um risinho pudico, próprio de sua estirpe celestial. No entanto, outra vez um estalo repercutiu, e ele notou o galho arriar mais de um palmo. Reparou, ademais, como os olhos da onça aboticaram, a bocarra crescera, o lombo e o restante do corpo. Conjecturou que, se ela arriscasse um salto, o alcançaria sem muito esforço, mas por algum motivo não se movia. Apenas mirava-o com apetite, lambendo-se, sugerindo que, se permanecia ali, era porque o esperava descer por vontade própria. E Quatro-Ventas, agarrado ao galho como muitos se estreitam a um coqueiro para tirar-lhe os frutos, deu fé que de sua bainha deslizava a peixeira, seu único instrumento de defesa.

— Padim, me permita renovar a promessa. Em lugar de Reinoso, dou meu gado ao senhor, todinho!

Ato contínuo, avistou a lâmina no chão, próxima à onça. O animal, afastando-se um pouco do tronco da baraúna onde Quatro-Ventas se pendurara, se deslocou uns metros e cheirou aquele objeto luminoso, caído ao lado do chapéu de couro. Sondou primeiro a lâmina, demorando-se uns instantes, e depois pousou as ventas sobre o chapéu. Por fim, em vez de voltar ao lugar de antes, ou mesmo investir na presa vigiada, a onça simplesmente lançou um olhar derradeiro a Quatro-Ventas e deu meia-volta, enfiando-se na mata a pisadas arrastadas, como quem inexplicavelmente mudara de ideia.

Enquanto descia do pé de pau, a lividez do rosto de Quatro-Ventas se desfazia. Catou a peixeira e pôs o chapéu de novo na cabeça molhada de suor. Questionou interiormente se o que viveu fora ilusão ou verdade, mas ao verificar os sulcos que as unhas da onça deixaram na baraúna e o galho torto em que se pendurara, fiou-se que tudo ocorreu, e que ele escapou da morte certa. Ao imaginar como contaria aquela história a seus filhos e mulher, escutou um relincho. Tratava-se de Reinoso, que, certamente por atinar a passagem do perigo, veio ao encontro do dono. E o riso aliviado de Quatro-Ventas alargou-se duas vezes, ainda em dúvida se tresvariava ou não…

De regresso ao sítio, chamou a mulher, os filhos e, na varanda, narrou-lhes o sucedido. Todos o fitavam embasbacados, crendo tratar-se de história mal contada ou imaginada. Mas não, disse Quatro-Ventas: tudo era tão real quanto o telheiro que os cobria. Os presentes opinaram que ele devia esquecer a vaca, pois decerto a onça a matara, e por isso desistiu de atacá-lo. Logo — opinou Lucineide —, o melhor era esperar; o tempo abonaria a ele novo animal, tão bom quanto o que se perdeu.

No dia seguinte, entretanto, ao concordar em não seguir sua procura, Quatro-Ventas surpreendeu-se mais uma vez, não por causa de uma onça, mas de um rapaz. Este, trabalhador de seu Lourenço dos Monturos, veio a cavalo trazer-lhe Mimosa, que de algum modo parara nas propriedades do seu comprador de leite.

— Diga a compadre Lourenço que muito agradeço o favor — encomendou ele.

O rapaz se foi. Tangendo Mimosa de volta ao curral, um alumbre recordou Quatro-Ventas das juras que direcionara a Padim Ciço por ocasião de seu livramento. E um novo ar de gracejo achatou-lhe a cara, ao qual se seguiu o seguinte desabafo:

— Eh, meu Padim, se o senhor quiser gado, que arranje o seu… O meu não dou pra ninguém, não.

 
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Detalhes do autor

Rafael Teixeira de Souza

Natural de Pedra, no Agreste de Pernambuco. É mestre em Literatura Comparada pela UnB, onde atualmente cursa doutorado.